domingo, 2 de agosto de 2009
Madrid: 2007-2008 Parte 1
3:19. Estava descansando no meu sofá a pensar na vida e eis que me entra pela casa dentro imagens de Madrid. Um programa de 3 jovens portugueses a viajar por Madrid e a conhecer a cidade e isso fez-me sorrir… Tal como sorrio quando escuto alguém a falar espanhol, quando oiço uma música que me faça lembrar esse meu ano passado em Madrid…Tal como sempre que algo me faz lembrar episódios que vivi lá… Amigos que fiz e que nunca esquecerei, pessoas que me marcaram e me ajudaram como nunca poderão imaginar e num daqueles que foram dos anos mais felizes da minha vida.
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Dizem que Erasmus é one life time experience. Que devemos aproveitar ao máximo e é verdade. Aconselho vivamente a todos a experimentar se puderem. Vençam o medo, mandem-se à aventura, se forem sozinhos melhor ainda…
Desde miúdo sempre tive o sonho de ir para Erasmus… Sair do meu país, e ir para outro não apenas em turismo e não conhecer a cidade pelos olhos apenas de um turista… Ir para um sítio, chegar anónimo, não conhecer nada nem ninguém e ter que escrever uma página nova, acabando assim por me renovar a mim próprio e com a esperança de no final da viajem voltar mais forte, conhecendo-me melhor a mim próprio e trazendo algo de bom comigo da experiencia.
Devo confessar que o meu sonho sempre foi ir para o meu local especial e mágico que é Londres…Mas como na minha faculdade não tinha essa oportunidade…comecei a pensar noutras alternativas…Pensei em Itália, mas depois vi que a ir seria melhor ir para um país em que aprendesse um idioma que me fosse útil. Espanhol, pensei eu. E sendo Espanha para mim so faria sentido uma das duas maiores cidades: Madrid ou Barcelona…
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Sempre havia tido uma ideia algo romântica em relação a Barcelona e à Catalunha…mal sabia eu que o meu coração seria madrileno… Madrid não me dizia nada até lá chegar. Mas aí reside a lição e magia de tudo… Não são os locais que os tornam mágicos, são as pessoas e os momentos que por causa dessas pessoas neles vivemos…
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Escolhi Madrid pela cidade unversitária enorme e a possibilidade de viver num Colegio Mayor… Ficava perto do centro de Madrid pois a rede de metro de Madrid é das mais extensas e de melhor qualidade da Europa e ao mesmo tempo viveria numa verdadeira cidade universitária ao melhor estilo americano…
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Antes de tudo, tive que ir sozinho a Madrid conhecer os colégios e recolher toda a informação necessária. Fiquei perplexo com o que vi… A experiência de ter que andar de um lado para o outro e sem dominar ainda bem o idioma ter que me safar foi algo estranho qe nunca havia tido… Conhecer aquela cidade sozinho nesses dias e pensar se seria ali o meu futuro no ano seguinte, foi uma experiencia única… Como se houvesse uma química irresístivel que me dizia que ali poderia ser a minha casa.
Não tive dúvidas, depois dessa viagem que era ali que eu queria ficar.
Saír na estação de metro Ciudad Universitária e ver um Mundo diante de mim totalmente novo com todas as Faculdades , residências e colégios mayores concentrados numa única cidade dentro da própria cidade foi algo de arrebatador… Porque o nome cidade universitária aplica-se ali como nunca vi em lado algum. Engraçado pensar quando se falava em Portugal de espírito académico… Ali tudo era dimensionado a outro nível… Parecia tão perdido que prontamente um estudante ao ver-me embasbacado me perguntou que faculdade procurava e me deu indicações. Vi que tinha que ver num mapa para encontrar a minha faculdade. Incrível…O máximo que havia visto em Portugal era a tradição de Coimbra, uma cidade de estudantes…Mas ali via uma cidade de estudantes com bares, restaurantes, lavandaria, residências, colégios mayores, discotecas, campos de futebol e de todos os desportos etc…tudo dentro ainda da multi cultural e cosmopolita Madrid…
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Não me lembro de ter andado tanto a pé… Fiquei a conhecer a cidade universitária a pente fino, mas mesmo assim tinha que apanhar o metro ou autocarro porque era simplesmente impossível conhecê-la toda a pé.
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Percorri todos os colégios mayores. Falei com as pessoas, tirei fotografias de todos e trouxe formulários dos que me interessavam.
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Muitas vezes tentava explicar o conceito de Colegio Mayor, mas é complicado entender a quem nunca tenha vivido num. Não há nada que se assemelhe em Portugal, pois não é uma residência, pois dessas lá também havia, nem é uma república. É mais que isso… É uma casa, uma pequena grande comunidade que todos amamos e acarinhamos mesmo que não nos demos bem todos uns com os outros, há sempre grupos, mas todos nunca esquecem o amor ao Colegio.
São os melhores anos dizem… Enquanto numa residência dorme-se, come-se e pouco mais…Um Colegio é uma experiência sócio-cultural totalmente diversa.
Temos todas as condições. O quarto é minúsculo, uns com casa de banho partilhada por 2 ou 4 e outros individual. Mas depois temos pequeno almoço, almoço e jantar, lavandaria, uma espécie de vidioteca que podemos pedir todos os dvds que queiramos tal como funciona numa biblioteca. Sala de vídeo, rádio, salon de actos onde se dão concertos, fazem-se eventos culturais ou simplesmente se transmitem eventos desportivos ou culturias e sociais par todo o colégio e onde se fazem também projecção de filmes… Dois por dia na época de exames para que todos possam relaxar… Conta com ginásio, campo polidesportivo, piscina no verão, salas de estudo individuais e colectivas e ainda sala específica para arquitectura e até uma sala de festas para quem queira dar uma tal como sala de Tv com todos os canais à disposição.
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Não há Erasmus iguais. Aprendi ao longo do ano que o Erasmus é aquilo que nós queremos fazer dele… Daí uns dizerem que Madrid é maravilhoso e outros poderem não gostar, uns dizerem que Erasmus numa cidade é genial e outro não ter gostado… Depende do que essa pessoa fez para se adaptar, das suas expectativas…
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Eu não queria um Erasmus convencional…Não queria dar-me com um montão de portugueses e apenas estrangeiros de todo o Mundo e falar mais em inglês ou português que espanhol…Ser durante um ano um simples erasmus , um simples estrangeiro a viver em Madrid, mas sem qualquer ligação a ela…
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Se ia para Madrid eu queria ser parte daquela cidade, conhecer as pessoas, ver como pensam, os seus costumes, os seus hábitos…Então nada melhor que ir para um sítio aonde vivia com cerca de 250 espanhois.
No fundo eu nã queria passar por Madrid apenas, queria sentir-me como um português é certo, mas integrado em Madrid e não num grupo de não sei quantos estrangeiros… E acabei por sair com Madrid no coração, e o engraçado é que cheguei lá sentindo-me totalmente fora de tudo e era apenas “em português” e saí de lá continuando a ser o el “Portu” ou “ portugueiro “ ou “português” mas com todos a dizerem-me que já era mais espanhol que português… No final era um deles, e essa foi a minha maior conquista.
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Para entrar num colégio não é nada fácil. São muitas mais as pessoas que querem ir para um que as vagas existentes… Eu acabei por ficar encantado com um chamado San Agustín por um vídeo que vi no Youtube muito emotivo de um ano da vida colegial lá… Mas não era esse que me estava destinado…
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O processo de selecção passa por analisarem as notas dos alunos que chegam aos colégios e geralmente os novatos são alunos do 1º ano de faculdade…Pois eu era um caso diferente…lol.
Muito do processo de escolha assentava na análise de uma carta que tínhamos que fazer a falar de nós próprios e do porquê de querermos ir para aquele Colegio.
A seguir a fase decisiva era a entrevista…
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Pois eu fiz uma composição e enviei para todos os que me haviam agradado…Chamaram-me a entrevistas e o lá voltei eu a Madrid sozinho por 3 dias a fazer umas 5 ou 6 entrevistas…
Todas correram bem, ficaram todos surpreendidos com o meu castelhano, eu não sei porquê safava-me bem, talvez por ler jornais espanhóis desportivos, por ter visto muito Tsubasa em espanhol não faço ideia…Sempre tive jeito para idiomas e o espanhol saía-me naturalmente.
Curiosamente no colégio aonde fiquei mais com o pé atrás, por me terem obrigado a fazer um teste de cultura geral foi o colégio em que acabei por ficar… A minha casa…Colego Mayor Universitário Chaminade…
Na altura quando me chamaram de lá, só escolhi lá ficar por ser o mais barato e não ter ficado no tal que tinha visto na altura…
Mal eu podia imaginar a sorte que tinha tido… Tratava-se do colégio de Madrid mais popular, por ser o mais liberal, em que todos podiam ter a liberdade de fazer o que queriam e em que havia muita pluralidade, eles escolhiam pessoas totalmente diferentes… Daí haver os tradicionais subgrupos… Os “freakys” geralmente associados a matemáticas, físicas etc, os chamados totós que nos filmes americanos os vemos fechados no cacifo mas com bom coração, os hippies, vestidos com roupas hippies numa de paz e amor muito zens e consumidores de erva , curiosamente o grupo que menos me identificava por não entender como o despojo de bens materiais típico dos hippies e de paz e amor se dava com gastar o dinheiro dos paizinhos em erva e roupas da moda hippie… e pelo facto de para hippies serem bastante fechados neles mesmos. Havia depois os gajos do Rugby, os típicos também de filmes americanos todos machões que odeiam os freakys, que praticam o desporto mais nobre de toda a universidade e se embebedam no final de todos os jogos num jogo chamado “terceiro tempo”., havia ainda espaço para outros vários semi grupos, los fachos que eram os que tinham ideias de direita e geralmente conhecidos põe se vestirem de modo muito beto… Las pijas as raparigas betinhas que se vestiam de forma beta e eram as populares do colégio…
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E não pararia se continuasse…
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O 1º dia é uma lapada na cara sempre para quem vai sozinho para Erasmus…Saudades daqueles que mais queremos que ficam para trás, pensar que não os veremos durante tanto tempo e que chegamos a um sítio desconhecido em que todos falam tão rápido que não apanhamos nada nem ninguém nos entende muito bem e em que não sabemos como nada funciona…
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Pensei que iria chegar ao colégio e teria uma recepção de boas vindas…Geralmente chega-se mais cedo em Setembro, eu por causa dos exames cheguei em Outubro, já haviam grupos formados e pessoas que se conheciam… Chego lá e o porteiro (são 4 e revezam-se pois tem que haver um sempre durante 24h, são os baluartes do colégio, estão lá sempre, sabem a vida de todo o colégio, já viram de tudo, várias gerações a passar por ele e geralmente são quem recorremos quando há algum problema e um deles tornou-se um grande amigo como verão adiante, era quase um pai para mim lá) diz-me que tenho que ir comprar Almofada ao Shopping. É domingo, fim da tarde, nunca saí muito fora da cidade universitária e tenho que ir sozinho até a um shopping com muito poucas indicações e sem saber muito bem como voltar ou se voltaria uma vez que ficava noite e nem sabia bem o caminho…
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Chegar lá e pedir as coisas, ouvir as pessoas a falarem todas ao mesmo tempo… Aí percebi que afinal o espanhol não é assim tão fácil…
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Depois de tudo, chegar ao meu quarto e ver um cubículo minúsculo numa cidade altamente poluída comparada com o meu Porto no que diz respeito à qualidade do ar…
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Ir jantar sozinho e não perceber como funciona a cafetaria, (sóé necessária aos domingos que é quando não nos servem comida apesar de estar aberta durante toda a semana) e que tinha que escrever o que queria num papel com o meu nome para me servirem… Um filme… Felizmente a caminhada começou aí… Um novato viu-me atrapalhado e perguntou-me se eu era novato… Pois era…Caloiro novamente, mas agora num país estrangeiro… Convidou-me simpaticamente a jantar na mesa dele com ele e uma amiga que também estavam a chegar pelo 1º dia a Madrid… Ambos do País Basco.
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Falei das minhas preocupações, descobri que deveria ter a minha roup marcada para a lavandaria com um número que era o meu e nem sabia e pensei q tava lixado… Ele foi simpático e deu-me um marcador que guardei o ano todo e com o qual marquei parte da roupa até voltar a Portugal e a mamã coser como cosiam as mamãs de muitos deles.lol.
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Fomos passear pela cidade universitária, ver as novatadas ( sim, nos colégios há praxe e bem dura) de outros colégios, pois o nosso era o único de Madrid que era anti novatadas.
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Havia um conceito também engraçado… La cartelera. Um local mesmo à saída do comedor aonde almoçávamos e jantávamos e junto das salas de estudo. Nele podíamos escrever notas, escrever textos, colocar cortes de jornal etc, tudo o que quiséssemos desde que nos identificássemos com o nosso nome e número da habitação.
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Era um espaço de democracia e liberdade para muitos se queixaram de coisas que não gostavam, de fazer avisos sobre eventos do colégio como apoiar os jogos das equipas, festas, e servia muitas vezes como centro de polémicas entre grupos rivais que esgrimiam argumentos via cartelera ou até de confrontações entre colegiais e a direcção do Colégio….Servia de protesto contra medidas que os colegiais não estavam de acordo.
Para isso havia uma mesa colegial, um órgão para o qual todos os anos se elegiam 3 pessoas de todo o colégio e que dava bastante popularalidade, mais do que poder de facto. Porque na prática era a direcção que tomava as decisões. Mas as assembleias colegiais eram uma espécie de RGA, todos se reuniam para debater assuntos importantes para o colégio, os ânimos também se exaltavam , e tinha a particularidade dos directores do colégio estarem sempre presentes para ausculutar o pensamento dos colegiais.
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Viver num Colegio Mayor é toda uma experiência em si mesma… É aprender a adaptarmo-nos a pessoas que pensam de forma diferente, saber conciliar, saber aproveitar as oportunidades que temos de fazer desporto, de nos divertirmos de fazer amigos, de aprender mais sobre a cultura de cada região de Espanha, pois nos colégios havia gente de toda a parte de Espanha que ia estudar para Madrid. São espaços de desenvolviimento social e cultural e que nos faz crescer como seres humanos. Prepara-nos para a vida lá fora, fora das paredes do colégio.
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Em Madrid a lógica é diferente… Cá em Portugal os nossos amigos são geralmente aqueles da nossa faculdade, é lá que passamos mais tempo… Em Madrid não é bem assim. As universidades são enormes, as faculdades têm várias turmas, com vários professores diferentes e o horário acaba por ser algo flexível.
Há saídas com o pessoal da turma da faculdade e até se pode fazer um amigo ou outro…Mas os verdadeiros amigos, aqueles que são quase como família, esses são aqueles que vivem connosco… São os do nosso colégio que defendemos acima de qualquer outro. Seja nas competições desportivas que são autênticos espectáculos e com assistências que fariam corar de vergonha muitas assistências de jogos de equipas de futebol de divisões secundárias do nosso país…
Mesmo não sendo todos do mesmo partido, do mesmo clube, nem tendo todos a mesma capacidade de aceitar as diferenças e mesmo não sendo todos amigos de todos, há espírito colegial… Somos do mesmo colégio, é como uma família. Há regras de convivência que são respeitadas. Os horários de comer são sempre todos à mesma hora, todos comemos juntos e por isso vamos conhecendo outras pessoas nem que seja à hora de comer… Regras de boa educação como servir os outros antes de nos servirmos e de partilhar são seguidas sem pensar sequer.
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Depois há os clubes…Desde clube de cinema, a de Direitos Humanos, de cultura japonesa, de informática etc… Tudo formas de fazer actividades em conjunto e de conhecermos outras pessoas.
....(cont)
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